18 Ago 2016
Valorizar a história, para projetar o futuro
Américo Nascimento nasceu há 57 anos em Queimadas, no município da Ribeira Brava, em São Nicolau. Até completar a sexta classe de escolaridade, Américo Nascimento nunca saiu de São Nicolau. Depois veio o tempo do liceu e com ele a sua ida para São Vicente. Terminou o ensino secundário em 1977 ao que se seguiram dois anos como professor. Pessoa ativa e interventiva, Américo Nascimento participou e liderou alguns movimentos cívicos, sociais e políticos. Criou e dirigiu um clube desportivo em São Nicolau e, ao nível político, participou ativamente em ações da JAAC – Juventude Africana Amílcar Cabral.
A oportunidade de fazer um curso superior surgiu em 1980. Américo Nascimento parte então para a República da Ucrânia, na ex-União Soviética, onde viveu durante cinco anos e onde se licenciou em Educação Física e Desportos. Terminados os estudos superiores, regressa à sua terra natal. Numa ilha onde ainda tudo estava por fazer, dedicou-se, durante quatro anos, a lecionar e a promover o desporto em São Nicolau.
Em 1988, Américo Nascimento foi quase que intimado a integrar o Ministério da Educação. Mudou-se então para a cidade da Praia, em Santiago. Como quadro superior do Ministério, Américo Nascimento foi o responsável pela área da Educação Física e Desportos. Em 1991 tornou-se diretor geral dos desportos. Antes de regressar a São Nicolau para se candidatar à presidência do município da Ribeira Brava, Américo Nascimento exerceu ainda, de 2001 a 2004, o cargo de presidente do Conselho de Administração da RTC e, de 2004 a 2008, integrou o governo de Cabo Verde assumindo as funções de Secretário de Estado da Juventude e Desportos.
Em 2008, Américo Nascimento concorre à presidência da Câmara Municipal da Ribeira Brava pelo PAICV e vence as eleições autárquicas tendo sido reeleito em 2012. Cumpre atualmente o seu segundo mandato.
Para Américo Nascimento, a Ribeira Brava “é muito mais do que o território onde se encontra delimitada. A Ribeira Brava tem mais população na diáspora, nomeadamente nos Estados Unidos da América, Holanda e Itália, do que propriamente no município. Esta universalidade engrandece-nos enquanto ribeira-bravenses. É um município que adoro e que me dá orgulho não só ser de S. Nicolau, de ser cabo-verdiano, mas particularmente, de ser da Ribeira Brava”, regozija-se o autarca.
A Ribeira Brava tem uma população relativamente pequena para a sua superfície. Comparativamente, ocupa aproximadamente a mesma área que São Vicente, mas tem apenas um décimo da sua população. É essencialmente uma ilha rural, com potencialidades ao nível da agricultura. Esta é a grande aposta do autarca, que, aos poucos, pretende “criar sustentabilidade económica baseada nos recursos internos do próprio município, nomeadamente a agricultura, a pecuária, mas também a cultura e a própria história, que é riquíssima”, afirma o presidente da câmara, adiantando que, “enquanto município, a Ribeira Brava tem muitos atrativos; apenas têm que ser potenciados e transformados em algo prático e palpável capaz de proporcionar melhores condições de vida às suas populações”, adianta.
Valorizar o rico património histórico, arquitetónico e cultural da Ribeira Brava tem sido, precisamente, uma das grandes apostas do atual presidente da Câmara Municipal. Conforme explica, “a Ribeira Brava é um município que cativa as pessoas, não só pela sua pacatez, mas também pelo percurso histórico, cultural e intelectual. A conjugação destes fatores acaba por moldar as pessoas e diria que há uma civilidade acima da média do próprio país. Temos uma cultura extremamente rica”.
Em outubro de 2014, a Ribeira Brava candidatou-se à Capital da Cultura de Cabo Verde. Apesar de ter pretensão em ganhar ficou na terceira posição, apenas perdendo para a Cidade Velha e para o Tarrafal, ambas em Santiago, o que diz bem da sua importância histórica para a cultura cabo-verdiana.
Também ao nível da religiosidade, a Ribeira Brava assume um papel de destaque na história da Igreja em Cabo Verde. Foi na Ribeira Brava que se instalou o primeiro Seminário-Liceu em 1866 e que funcionou, até 1917, como principal polo de conhecimento eclesiástico, científico e cultural de Cabo Verde. Deste seminário saíram vários intelectuais de relevo que viriam a ter um papel determinante no futuro do país. Américo do Nascimento é de opinião que, “a Igreja teve, em São Nicolau e em especial na Ribeira Brava, um papel fortíssimo na educação das pessoas, mas também naquilo que é a sua raiz cultural. A Igreja também era como uma autoridade o que acabava por moldar a personalidade das pessoas”, afirma.
Esta forte presença da Igreja na Ribeira Brava acabaria por ter um papel preponderante na própria traça arquitetónica da vila. A outrora Sé Catedral da Diocese de Cabo Verde e da Guiné tinha aqui a sua sede, apenas perdendo a sua importância quando, em 1944, o bispado transferiu a administração eclesiástica para a cidade da Praia. Atualmente, existe um movimento cívico na Ribeira Brava que reivindica novamente o título de Sé para a Igreja de Nossa Senhora do Rosário. Contam poder reaver essa denominação histórica, o que, para o presidente da Câmara, “do ponto de vista cultural seria muito importante para os ribeira-bravenses”.
Embora ostente o estatuto administrativo de cidade, para os seus habitantes a Ribeira Brava é, e sempre será, a Vila da Ribeira Brava. Tal como refere Américo Nascimento, “fizemos questão de fazer essa solicitação ao governo que, à semelhança de outras cidades que existem, por exemplo, em Portugal — como é o caso de Vila Nova de Gaia e tantas outras — mantivéssemos o nome de Vila da Ribeira Brava. Para nós, o termo “vila” tem um carinho especial e pretendemos ficar com essa denominação que também é património nacional. Estamos empenhados em conservar a sua traça arquitetónica e em continuar a promove-la como um cartão de visita da cultura e da história de Cabo Verde”, afirma o autarca.
Apesar da sua grandiosidade histórica, patrimonial e cultural, a Ribeira Brava ainda enfrenta alguns desafios. Os transportes de, e para a ilha, são alguns dos constrangimentos ao desenvolvimento de São Nicolau. Tal como reivindica Américo Nascimento, “os quatro voos semanais que existem são reconhecidamente insuficientes. Também precisamos de mais ligações marítimas. É fundamental ligar São Nicolau ao mundo; não apenas às outras ilhas”, afirma.
No que às infraestruturas diz respeito, o presidente da câmara reconhece que ainda existe muito trabalho que tem de ser realizado, mas que “tem de ser feito aos poucos, com os escassos recursos que o país possui. Neste momento estamos a construir uma barragem hídrica que será de vital importância para o desenvolvimento agrícola do município e estamos empenhados em melhorar a nossa rede viária. Ao nível da saúde, precisamos de mais e melhores equipamentos. Por causa da nossa dimensão, não podemos expectar ter em São Nicolau todas as especialidades médicas, mas, pelo menos, ambicionamos possuir uma sala para pequenas cirurgias e que a telemedicina funcione. O mesmo relativamente ao ensino e à educação. Temos consciência que não poderemos ainda ambicionar ter uma universidade em São Nicolau, mas queremos, através das novas tecnologias de comunicação, estar ligados ao resto do mundo e usufruir dos avanços no conhecimento em pé de igualdade com o resto das ilhas do arquipélago”.
Apesar destas carências, Américo Nascimento está empenhado em continuar a trabalhar para o desenvolvimento da Ribeira Brava e em proporcionar melhores condições de vida aos seus munícipes. A todos eles relembra que, “independentemente das adversidades que possam surgir, jamais devemos baixar os braços e darmo-nos por vencidos. Por mais difícil que pareça a situação, se cruzarmos os braços ficará pior. Temos que ter confiança, esperança e não podemos deixar de acreditar em nós mesmos. Temos de lutar pelo que acreditamos, pois apenas dependemos da nossa capacidade de trabalho. Temos de continuar a sonhar pois, certamente, esses sonhos um dia se realizarão”.