José Silvestre de Almeida – Nhô Jó
18 Mar 2021

José Silvestre de Almeida – Nhô Jó

O meu nome é José Silvestre de Almeida. Sou natural de Santo Antão. Nasci a 24 de Março de 1937. Tenho 78 anos. Em Cabo Verde trabalhava na agricultura e criava alguns animais, mas a falta de chuva fazia com que muito do nosso esforço fosse infrutífero. Como vivia no interior da ilha, também não me aventurei nas pescas, como tal, resolvi vir para São Tomé e Príncipe tentar a minha sorte. 

Vim no navio Luanda. Saí de São Vicente a 8 de maio de 1960 e cheguei ao Príncipe no dia 20. Vim com a minha companheira com a qual já tinha uma filha. Ela estava um pouco despreparada, pois na época não tínhamos grandes condições e como eu não sabia o que me esperava aqui, achei por bem ela ficar em São Tomé, pois sempre tinha lá a irmã que a poderia auxiliar, e eu vim para o Príncipe. A minha ideia era trabalhar os três anos do contrato e depois ir embora para Cabo Verde. Mas as coisas não correram como inicialmente idealizei e fui renovando o contrato. Primeiro mais dois anos, depois mais três e acabei por ir ficando. Já estou no Príncipe há mais de 56 anos. 

A primeira roça para a qual trabalhei foi a Sundy. Naquele tempo trabalhávamos muito. Levantava-me às 4 horas da madrugada e ia logo para a formatura para a contagem. Às 5 e meia já estava no trabalho. Trabalhávamos até às 5 da tarde; apenas parávamos meia hora, às 7 da manhã, para o pequeno-almoço e depois duas horas, por volta das onze da manhã, para o almoço. Às 5 da tarde voltávamos para a roça. Os que trabalhavam com o capim, muitas vezes ainda tinham que fazer o percurso de regresso à sanzala com um fardo de capim à cabeça, pois era necessário para os animais que estavam na sanzala se deitarem. Por vezes, pedíamos ao capataz para usar algum do capim que carregávamos para fazermos as nossas próprias camas. Depois tomava um banho e jantava de panelão, junto com todos os outros. Fuba com peixe, ou com feijão e, por vezes, com carne. Eram tempos difíceis.

Entretanto São Tomé e Príncipe tornou-se independente e as coisas alteraram-se. Nos primeiros tempos até parecia que tudo iria dar certo, mas com o passar dos anos as condições tornaram-se cada vez mais difíceis. Ainda tenho família em Cabo Verde que me poderia acolher. Tenho uma irmã no Calhau e um irmão em Monte Sossego, em São Vicente, mas se regressasse iria sempre sentir-me como um hóspede. Fui lá em 1986. Paguei as passagens e fui lá com a minha mulher e uma nossa filha. Visitei a minha família mas vi que Cabo Verde já não era para mim. Aqui encontrei a Genoveva, também de Porto Novo, Santo Antão e, com ela, tive mais dez filhos. Morreram cinco e ficaram outros cinco. Entretanto a Genoveva faleceu e eu agora sinto-me um pouco cansado e doente. Estou a viver com uma nova companheira que cuida de mim. 

Apesar de todas as dificuldades, é aqui que me sinto feliz. Aqui trabalho e é aqui que me alimento, por isso, o meu lugar é aqui. O homem é da terra onde trabalha e a terra é dos homens que a trabalham. O essencial é haver respeito e dignidade. Vivi 23 anos em Cabo Verde e 56 em São Tomé, por isso, já me sinto mais são-tomense que cabo-verdiano. Esta é já a minha terra. Foi aqui que construí a minha família e é aqui que me sinto bem.

Dependência Bela Vista – Príncipe


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