João Domingos Barros – Tarrafal, um município recheado de potencialidades
30 Set 2012

João Domingos Barros – Tarrafal, um município recheado de potencialidades

José Domingos Barros, encontra-se há 12 anos à frente dos destinos da terra que o viu nascer. Cumpre este ano o seu último mandato como Presidente da Câmara Municipal do Tarrafal. Economista de profissão, foi quadro do Ministério das Finanças, com uma passagem posterior pela Cabo Verde Telecom. Considera que, quer pela sua história quer pelas valências naturais e geográficas, o Tarrafal é um município que tem ainda muito a dar ao país.

[su_spacer]

9- Joao Domingos - Revista Nos Genti -

[su_spacer]

Falar do Tarrafal de Santiago, é falar não apenas da história de Cabo Verde, mas da história dos povos lusófonos. É no Tarrafal que podemos encontrar os vestígios da antiga prisão colonial, e que constitui um símbolo vivo da presença do antigo regime colonial português. Conforme refere João Domingos Barros, “este campo prisional, é património não só de Cabo Verde, mas também de todos os povos lusófonos e mesmo do mundo. Como tal, pretendemos preserva-lo e valoriza-lo enquanto história, pois trata-se de um marco para os PALOP. Estiveram aqui encarceradas muitas pessoas que lutaram, no âmbito dos movimentos de libertação nacionais (com especial destaque para angolanos, guineenses e cabo-verdianos), contra o regime fascista instalado, e essas memórias têm de ser preservadas.”

Cabo Verde e o resto dos PALOP, têm a consciência do valor histórico que este símbolo do antigo regime colonial representa. Para o autarca, “tem sido feito um esforço substancial para dar uma vida própria a este património, quer por parte do governo, quer ao nível do município. Apesar de os recursos não serem grandes, têm sido feitos esforços, nomeadamente pela parte portuguesa e cabo-verdiana, para a preservação deste património. Atualmente, tem-se estado a trabalhar para o tentar inscrever na lista de Patrimónios Mundiais da UNESCO.”

[su_spacer]

2- Tarrafal de Santiago - Revista Nos Genti -

[su_spacer]

O campo de concentração do Tarrafal regista inúmeras visitas ao longo do ano. Centenas de estudantes, investigadores, turistas ou simples curiosos, visitam este património histórico e cultural, no entanto, conforme refere João Barros, “infelizmente, os documentos de consulta que aqui estão, são ainda muito incipientes face aos que existem em Portugal, daí que muitos deles saiam um pouco dececionados das visitas. Contudo, têm a possibilidade de presenciar o espaço físico, o que por si só é bem revelador das dificuldades dos que por aqui passaram.”

Por se tratar de um importante marco da história dos povos de língua oficial portuguesa e do mundo, o ainda atual presidente da câmara em funções, acredita que este património possa vir a ser melhor rentabilizado, e que os frutos dessa capitalização possam vir a ser colocados ao serviço do Tarrafal e de Cabo Verde.

Mas o Tarrafal não se encerra no antigo campo de concentração. A expressão cultural dos tarrafalenses sempre teve grande projeção no panorama artístico do país. Aqui nasceram nomes importantes da música e das artes. Conforme recorda João Domingos, “ é natural do Tarrafal, o atual ministro da cultura Mário Lúcio – artista multifacetado e que muito tem contribuído para o fomento cultural do país – a par de muitos outros, como, por exemplo, o José Manuel Soares, o Princezito, ou o Beto Dias”.

Com os seus 18 mil habitantes, sempre que possível, o município tenta promover a cultura das suas gentes, seja na música (com a realização de espetáculos a quando das festas no município), na literatura (através de feiras e alguns apoios ao lançamentos de novas publicações), ou em muitas outras áreas de expressão cultural, como o artesanato e as artes plásticas. Conforme refere João Barros, “patrocinamos muitos autores, para que possam trazer à luz do dia as suas obras, contribuindo assim para o enriquecimento cultural do Tarrafal, e do país em geral. Com este objetivo, concebemos um espaço destinado a todas estas iniciativas culturais, ao transformarmos o antigo Mercado do Tarrafal, no atual Mercado de Artesanato e Cultura, com uma mostra permanente, uma sala de formação para música, teatro e dança, e um pequeno auditório com capacidade para 300 pessoas. Este equipamento, tem servido para que os artistas locais, apresentem ao público o seu trabalho”, acrescentando que “este espaço tem-se revelado extremamente importante na dinamização da vida cultural do município.”

[su_spacer]

11- Joao Domingos - Revista Nos Genti -

[su_spacer]

Ainda no domínio da dinamização cultural, o Tarrafal revela-se como um município extremamente ativo. A par das feiras de artesanato, é realizada a Feira das Comunidades, em que as gentes limítrofes à zona urbana, podem expor o que produzem. Conforme diz o autarca, “o intuito destas iniciativas é dar a conhecer às pessoas que nos visitam, o que de melhor temos para oferecer, facilitando assim a criação de riqueza às nossas comunidades rurais, e em última análise, a todo o município”.

A diversidade da oferta cultural e de lazer, fazem do Tarrafal um dos destinos preferidos das gentes de Santiago. As suas praias, as povoações mais tradicionais – das quais se destacam ainda alguns focos da presença dos Rebelados – o seu artesanato típico (com o Centro de Artes e Ofícios de Trás dos Montes e a sua mostra permanente de olaria, cestaria e  panaria), e a música tradicional – da qual se destacam as batucadeiras de Ribeira da Prata e Chã Bom –  fazem as delícias dos seus visitantes.

2- Joao Domingos - Revista Nos Genti -Contudo, a aposta na educação, foi a grande prioridade do autarca nestes doze anos de governação. Conforme recorda, “quando cheguei ao Tarrafal, encontrei um município que fazia parte da lista dos três mais pobres do país. O diagnóstico que fiz, é que essa pobreza tinha muito a ver com o atraso na educação e formação. Essa foi a minha grande aposta, por forma a podermos ter jovens com capacidade de intervenção, preparados para enfrentar o mercado de trabalho”, e lembra que, a quando da sua candidatura à Câmara Municipal, “não havia uma mulher com formação superior para integrar a lista. Hoje em dia, esse problema já não se coloca. Temos muitos quadros que se formaram através da Câmara Municipal e que diariamente contribuem para o desenvolvimento do município e do país. O Tarrafal deve ter enviado para Portugal, para completarem as suas formações profissionais e superiores, mais de mil alunos ao longo destes últimos anos. Foi nitidamente uma aposta ganha”, conclui.

João Domingos Barros, é da opinião que a solução para as altas taxas de desemprego que se verificam no Tarrafal, à semelhança do que acontece um pouco por todo o país, passa, em grande parte pela forma como os municípios negoceiam a entrada de investidores no país. Para o autarca, “os investimentos devem dar prioridade à criação de emprego”, e adianta que, “há setores, com grandes investimentos externos, que não geram riquezas”, e exemplifica com o caso do turismo.

Devido à sua privilegiada localização geográfica, o Tarrafal possui excelentes condições para investimentos no setor turístico, no entanto, conforme refere, “o modelo de exploração turística para o Tarrafal, tem forçosamente que ser diferente do praticado na Boa Vista ou no Sal, que são modelos que não criam riqueza às comunidades. Os grandes empreendimentos turísticos que se têm vindo a desenvolver nessas ilhas, são autónomos. Importam as batatas, os legumes, o peixe e a carne que consomem. A riqueza gerada pela sua exploração fica nos países de origem e Cabo Verde não lucra nada com isso. Quando se diz que o país cresceu 7% ao ano, temos que questionar onde ficou essa riqueza. Não queremos esse tipo de turismo para o Tarrafal. Preferimos um modelo em que as pessoas possam sair dos hotéis para consumirem na comunidade”, e conclui que, “as comunidades têm que fazer parte do processo, contribuindo através do fornecimento de produtos ligados à agricultura, à pecuária ou às pescas, pois têm capacidade e conhecimentos para o fazerem”.

[su_spacer]

4- Tarrafal de Santiago - Revista Nos Genti -

[su_spacer]

Outros setores com grandes potencialidades de exploração no Tarrafal, são o agroturismo, as pescas, a agricultura e a pecuária. Conforme relata, “há investidores com projetos aprovados nestas áreas, mas que, devido à crise mundial que atualmente se vive, suspenderam o arranque dos respetivos projetos, o que fez com que tivéssemos de desacelerar os processos que pretendíamos dinamizar”, no entanto, acredita que, “assim que as condições macroeconómicas melhorarem, esses projetos de investimento deverão retomar o seu normal desenvolvimento”, afirma.

Para o autarca, “todos os grandes investimentos, só têm sentido, depois de resolvida a questão da educação”, pois como adianta,  “se não houverem pessoas capacitadas para manterem esses grandes investimentos, iremos ficar dependentes do exterior, e isso é mau para as populações, pois não gera empregos, o que em última análise é prejudicial para o país, que despende recursos que poderiam ser aproveitados internamente”. Por isso, o autarca defende que, “em primeiro lugar devem estar as pessoas e só depois as infraestruturas”.

João Barros, é da opinião que, “nas decisões que envolvam compromissos de longo prazo e que abranjam grandes quantidades de recursos, deveríamos ouvir todas as forças políticas e económicas do país, incluindo as populações. Isto para dizer que não se pode fazer tudo ao mesmo tempo. É preciso desenvolver de forma gradual. Considero que desenvolvi o que tinha para desenvolver no tempo que servi as populações, mas para os que me sucederem, muito há ainda a fazer.”

[su_spacer]

6- Joao Domingos - Revista Nos Genti -

[su_spacer]

Durante os seus três mandatos, o Tarrafal saiu da cauda do desenvolvimento, ocupando atualmente um patamar intermédio. Foi o primeiro município de Santiago a ter uma rede elétrica de cobertura total e tornou-se num dos municípios onde o abastecimento de água às populações se encontra acima da média nacional. Em termos urbanísticos, João Barros é perentório ao afirmar que, “em Santiago, é voz corrente, dizer-se que o Tarrafal será a cidade do futuro.  Conseguimos encontrar um ponto de equilíbrio entre a pressão na procura de lotes de construção e a planificação. Conseguimos controlar a construção clandestina, que é prática que atualmente já não existe no município”.

Em jeito de balanço final destes doze anos de governação, João Domingos Barros afirma que, “foi uma experiencia pessoal gratificante. Aprendi a fazer a gestão da coisa pública, e pude compreender que os cabo-verdianos ainda têm muito a aprender. É preciso fazer política com mais ciência e não apenas a copiar o que se faz lá fora. Acho que temos políticos a mais para o número de pessoas que gerimos, e há administração a mais para a economia societária que estamos a servir. O nosso Parlamento tem 72 deputados, temos um governo com 20 membros, temos 22 municípios. Se juntarmos a isto tudo os funcionários públicos, penso que possuímos uma estrutura despropositada, para gerir apenas 500 mil pessoas. É altura de começarmos a pensar na reforma política e administrativa do nosso país, por forma a se gastar menos dinheiro captado por via dos impostos, com a classe política e administrativa.”

[su_spacer]

4- Joao Domingos - Revista Nos Genti -

[su_spacer]

Para o autarca, “Cabo Verde é visto como um país que faz bom uso dos recursos provenientes da comunidade internacional, no entanto, tal não quer dizer que não hajam falhas, apenas revela que cometemos menos falhas que os outros. Talvez tenha um pouco a ver com a nossa história e maneira de estar perante a vida: fomos educados a aprender a viver com pouco. Nestes anos que estive à frente dos destinos do município, através do recurso a créditos bancários, podia ter feito muitos mais investimentos, mas criaria infraestruturas que no atual momento não são prioritárias, por isso os evitei. Possuímos um município não endividado. Penso que as políticas sociais devem ser feitas com as receitas correntes, pois têm que ser implementadas no dia-a-dia. O recurso a créditos bancários só é justificável na criação de infraestruturas geradoras de rendimentos que contribuam para o desenvolvimento atual, e não para um futuro longínquo.”

Ao seu sucessor, João Domingos Barros pede que “respeite o património coletivo – que é de todos – e que respeite os tarrafalenses, trabalhando apenas em prol do desenvolvimento dos seus munícipes e deste maravilhoso país, que é Cabo Verde.”


visioncast

Nós Genti Cabo Verde