Ildo Lobo – A voz de ouro de Cabo Verde
18 Ago 2016

Ildo Lobo – A voz de ouro de Cabo Verde

Um homem de palco, de coração grande e que, com a sua voz inimitável, homenageou a música tradicional de Cabo Verde. Nascido em Pedra Lume, na Ilha do Sal, Ildo Lobo viria a tornar-se, com apenas 19 anos de idade, vocalista do grupo Os Tubarões. Esta relação, que iria durar mais de vinte anos, viria a marcar-lhe a carreira. Foi uma simbiose raramente repetível que fez com que Os Tubarões se tornassem o grupo musical com maior longevidade em Cabo Verde. Neles, a música cabo-verdiana viria a conhecer novos caminhos. Em 1996, lançou o seu primeiro CD a solo, a que se seguiram outros dois, num verdadeiro tributo à essência e à pureza da música cabo-verdiana. Morreu, prematuramente, a 20 de outubro de 2004 deixando-nos uma carreira musical repleta de sucessos. Será, para sempre, recordado como a Voz de Ouro de Cabo Verde.

 

A 25 de novembro de 1953, em Pedra Lume, na ilha do Sal, nascia Ildo Neves Silva de Sousa Lobo. Descendente de uma família com grandes tradições na música cabo-verdiana, o jovem Ildo viria a herdar as magníficas faculdades vocais do seu pai, Antoninho Lobo, talentoso cantor e homem dedicado à música nacional.

Ildo Lobo

Em Pedro Lume com os irmãos Djidjé e Piduca

Foi, através do pai, que Ildo começou a se interessar pela música. Apesar de viver com os avós, a determinada altura da juventude o relacionamento com o pai tornou-se mais forte, o que acabou por influenciar o seu interesse pela música, em particular pelo canto. No então Externato do Aeroporto do Sal, onde estudava, Ildo Lobo, junto com alguns colegas, integrou um grupo cultural e, fruto do seu interesse pelo canto, começou a interpretar alguns temas musicais. Despertava assim aquela que seria a sua grande paixão: cantar as mornas e coladeiras de Cabo Verde.

Ildo Lobo

Ildo Lobo durante uma atuação na Ilha do Sal

Ainda no Sal, passa por alguns grupos musicais como os “Improviso” — que tocavam com instrumentos cedidos pelos militares portugueses estacionados na ilha — e pelos “Únicos”, o primeiro grupo musical com instrumentos elétricos a arecer naquelas paragens. Em 1970, Ildo Lobo foi para a Cidade da Praia, na Ilha de Santiago, para continuar os seus estudos académicos. Aí, junto com os colegas do liceu, continuou a cantar em alguns grupos até receber, em 1973, o convite para substituir o primo Luís Lobo como vocalista do grupo Os Tubarões, fundado em 1969. De 1973 a 1976, o grupo manteve a sua formação: Ildo Lobo na voz e guitarra, Jaime do Rosário na guitarra solo e sopros, Mário Bettencourt “Russo” na viola baixo, Zeca Couto nos teclados e Duia na bateria. Os Tubarões haveriam de durar 22 anos até, em 1995, suspenderem a sua atividade.

Ildo Lobo

No Externato do Aeroporto do Sal, onde estudava, junto com alguns colegas

É nos Tubarões que Ildo Lobo haveria de afirmar todo o seu talento, transformando-se na imagem de uma banda que, durante mais de vinte anos, foi o símbolo musical de Cabo Verde. Para esta impressionante longevidade do grupo, algo raro no panorama nacional, contribuíram o espírito de camaradagem, de dedicação e de sacrifício dos seus elementos. A organização e a minúcia que empregavam na atividade fez deles os verdadeiros embaixadores da música cabo-verdiana além-fronteiras. Das inúmeras visitas e digressões que fizeram fora do país destacam-se as suas atuações em Angola, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau, Portugal, Estados Unidos da América, Holanda, Luxemburgo, Argélia, Senegal, Cuba, Brasil, entre muitos outros. Com a gravação, nos anos 90, do CD Porton di Nôs Ilha, a banda inicia uma carreira internacional de sucesso, em que a personalidade de Ildo se confundia com a do próprio grupo. À frente dos Tubarões, Ildo Lobo haveria de gravar seis LP’s — Pepé Lopi (1978), Tchon di Morgado (1979), Djonsinho Cabral (1979), Tabanca (1980), Tema para dois (1982) e Porton di Nôs Ilha (1994).

Ildo Lobo

1978 – Os Tubarões: Russo, Jorge Lima, Duia, Ildo Lobo, Totó, Jaime, José Rui e Zeca Couto

Em 1996, Ildo Lobo começou uma carreira a solo com o lançamento do CD Nôs Morna. Na promoção deste trabalho, o primeiro sem a influência de Os Tubarões, Ildo cantou por toda a Europa, incluindo a prestigiada sala New Morning, em Paris. Este seu primeiro trabalho a solo foi dedicado à memória de seu pai. Para tal, selecionou mornas dos mais conceituados compositores cabo-verdianos e fez-se acompanhar pelos melhores músicos nacionais, dos quais de destaca Manuel d’Novas, numa verdadeira homenagem à música que é parte da identidade de Cabo Verde. Para o músico, o trabalho Nôs Morna era como que uma serenata que oferecia a todos os cabo-verdianos.

Ildo Lobo

Em 1996, Ildo Lobo começou uma carreira a solo com o lançamento do CD Nôs Morna

Apesar de ser músico não profissional (Ildo Lobo era despachante oficial na Alfândega da Cidade da Praia) o sucesso que alcançou nunca lhe permitiu concretizar um outro sonho: o de poder viver exclusivamente da sua atividade enquanto músico. Muitas vezes crítico quanto à forma como os músicos e a atividade musical eram constantemente desprezados em Cabo Verde, Ildo Lobo sonhava um dia poder formar a sua própria editora e, com isso, contribuir para impulsionar e ajudar os mais novos. Também insistia na necessidade de formação musical desde tenra idade e que, deveria ser o Estado a proporcionar as condições para que a música fizesse parte da formação académica de todas as crianças cabo-verdianas.

Em 2001, Ildo Lobo lança, em Pedra Lume, o CD Intelectual. A grande distância temporal entre o primeiro trabalho e este (cinco anos) não o preocupavam. Para o músico, um disco era como um documento que deveria conter uma mensagem. Por isso mesmo, a qualidade dos seus trabalhos tinham primazia à quantidade. Neste seu segundo trabalho a solo, Ildo Lobo selecionou temas mais ecléticos. Alternou o romantismo da morna com a vibração das coladeiras, num verdadeiro hino à união e à cultura nacional. Fez-se acompanhar pelos músicos de Cesária Évora para reunir compositores que contribuiu para tornar conhecidos, como Betú, Alcides Spencer Brito, Luís Lima, Vaiss, Renato Cardoso entre outros.

Ildo Lobo

Ildo Lobo será para sempre recordado como a Voz de Outro de Cabo Verde

A 20 de outubro de 2004 Ildo Lobo sofre uma súbita paragem cardíaca que o retira prematuramente do mundo dos vivos. Para trás ficam mais de trinta anos a fazer brilhar os ritmos da tradição de Cabo Verde. Abraçou, com igual empenho e determinação, as causas culturais do seu país e as de outros povos que, tal como os seus irmãos, lutavam por melhores condições e por maior dignidade. Revelou novos talentos, fez brilhar olhos de emoção na diáspora e levou Cabo Verde ao mundo.

Ildo Lobo

A 20 de outubro de 2004 Ildo Lobo sofre uma súbita paragem cardíaca.

Gravado durante o verão de 2004, o CD Incondicional é então lançado a título póstumo. Nele, Ildo Lobo coloca toda a sua franqueza intelectual, num regresso às suas mais profundas convicções e que, apesar da fama e do sucesso, nunca o desviaram do seio do seu povo. Incondicional revela-nos toda a maturidade e coerência que fizeram de Ildo Lobo a Voz de Ouro de Cabo Verde.


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Comentários

  1. Borges carla Diz: Novembro 26, 2016 at 3:56 pm

    Muito obrigada,pelo artigo Fiquei à comecer um pouco da biografia do meu idolo.

  2. V. Monteiro Diz: Novembro 25, 2016 at 5:16 pm

    Muito bom este artigo.
    De quem é a autoria?
    Obrigado

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